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Uma cartilha para que mulheres identifiquem que são vítimas de assédio sexual on-line foi o produto final de pesquisa de Arienny Carina Ramos Souza, de 23 anos, graduanda em Ciências Biológicas no Instituto Federal do Pará. Durante o processo de investigação acadêmica, ela chegou à conclusão de que mulheres negras e de baixa renda são as principais vítimas desse tipo de crime.
O que ela não imaginava é que o trabalho seria reconhecido pelo 30º Prêmio Jovens Cientistas, na última quarta-feira (12). Ela e outros pesquisadores reconhecidos pela iniciativa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em parceria com a Fundação Roberto Marinho, relembram que os objetos estudados tiveram origem em ideais comunitários de transformação social e de prestação de serviço à coletividade.
Ao receber o prêmio, pesquisadores recordaram suas próprias origens humildes, estudos por horas a fio e sobre o que significa a curiosidade por criar e inovar pelo bem comum. Esse é o caso de Arienny, primeira colocada na categoria “Estudante do Ensino Superior”.
Ela foi orientada pelo professor Breno Alencar. Quando ela subiu ao palco para receber o prêmio das mãos da ministra Luciana Santos, da Ciência, Tecnologia e Inovação, Arienny destacou que era a primeira pessoa da família a chegar ao ensino superior.
“É uma emoção muito grande, dada a minha origem, e principalmente devido a ter sido oriunda de escola pública durante toda a minha educação básica”, disse.
O trabalho nasceu do inconformismo após casos de assédio praticados por professores contra alunas.
Agroecológico
Outro jovem cientista premiado foi Bernardo Souza Cordeiro, de 19 anos, também de instituição pública, que terminou o curso de Eletrônica no Colégio Técnico da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Orientado pelo professor Adriano Borges, ele foi o primeiro colocado na categoria “Estudante do Ensino Médio” ao desenvolver um dispositivo para produção de um defensivo agrícola agroecológico.
Surgiu a oportunidade de trabalhar com um projeto agroecológico IoT (sigla em inglês para ‘internet das coisas’) com um componente para possibilitar substituir os agrotóxicos.
“A gente queria que fosse uma alternativa barata. Esse defensivo só precisa de água e sal em um processo eletroquímico”, explica.
Ele explica que o ácido hipocloroso, que tem propriedades antimicrobianas, é obtido por um processo eletroquímico que usa energia elétrica. O protótipo desenvolvido fez parte dos ideais do rapaz de querer colaborar com pequenos produtores rurais.
Mais um motivo de comemoração recente é que ele foi aprovado, no último Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no curso de Engenharia de Controle e Automação na UFMG. Ele também foi o primeiro da família a ingressar em uma universidade federal.
“Meu pais estão muito orgulhosos. Meu pai não conseguiu completar o quinto ano e minha mãe fez curso técnico de enfermagem”. Os pais não entendem de eletrônica, mas compreendem bem a felicidade do rapaz. Os sorrisos multiplicaram-se.
Sensores
De multiplicação e sorrisos, o doutorando em física Wenderson Rodrigues também conhece. Estudante da Universidade Federal de Viçosa, o rapaz de apenas 30 anos criou sensores e equipamentos para saúde pública, segurança alimentar e monitoramento climático em uma pesquisa que foi premiada como primeiro colocado na categoria para mestres e doutores. Ele foi orientado pelo professor Joaquim Mendes.
Rodrigues recordou que se interessou pelo assunto desde o ensino médio. Ele disse que o trabalho consistiu no desenvolvimento de quatro dispositivos. Entre eles, há um dispositivo de detecção que mostra em uma tela se o paciente está ou não com o vírus.
“Essa é uma aplicação na área da saúde pública”, contou.
Outro resultado de suas pesquisas foi na área da segurança alimentar com o desenvolvimento de uma câmara de esterilização baseada em ampolas de mercúrio descartadas da eliminação pública. Ele contextualizou que, com a substituição de lâmpadas de mercúrio por lâmpadas de led, as que foram descartadas podem gerar poluição ambiental.
“A gente resolveu reutilizar, com sucesso, essas lâmpadas para esterilizar objetos e alimentos contaminados com bactérias”.
Ainda nesse combo de inovações, o rapaz criou equipamentos, baseados em materiais alternativos e sensores de baixo preço, com potencial de contribuir para fornecer informações precisas de dados meteorológicos locais para pequenos produtores que trabalham com agricultura familiar. “A ideia foi democratizar o acesso à informação meteorológica”.
Haja orgulho do professor Joaquim Mendes, que acompanha o cientista prodígio desde a iniciação científica.
“Ele é um estudante muito empenhado e tem um diferencial muito grande porque ele consegue trabalhar em mais de um problema ao mesmo tempo”.
O professor diz que o trabalho do aluno deve ser ainda mais valorizado pelas dificuldades financeiras que a família atravessou. “Ele conseguiu sair de uma condição humilde e chegou longe. A gente vai ouvir muito falar do Wenderson ainda”, afirmou.
Ciência contra negacionismo
O presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Ricardo Galvão, valorizou a trajetória e as histórias dos pesquisadores premiados. Ele afirmou que é fundamental incentivar esses jovens nos seus trabalhos.
“Nós temos que considerar esses jovens como faróis para os outros se desenvolverem. São faróis para as pessoas acreditarem que podem sim fazer ciência e tecnologia e serem reconhecidos por isso”.
O prêmio contemplou os ganhadores com computadores, bolsas do CNPq e valores em dinheiro, que variam entre R$ 12 mil e R$ 40 mil.
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A ministra Luciana Santos lamentou que o prêmio deixou de existir durante o governo passado e chamou de “nefasto” o negacionismo científico.
“Nós precisamos, cada vez mais, fazer a difusão e a popularização da ciência para poder enfrentar o obscurantismo. Nós precisamos vencer o obscurantismo com a produção científica”.
Lentes
O pensamento na ciência inspira jovens como Maysa dos Santos, de apenas 18 anos, que pesquisou no Instituto Federal do Pará (IFPA), no campus de Altamira, em estudo com sua professora Laís Castro, uma alternativa de microscópio de luz para o ensino médio na região do Xingu, no Pará.
Ela foi a terceira colocada na categoria para estudantes de ensino médio. Em vista de ter conhecimento de que apenas 38,8% das escolas de ensino médio têm espaço com microscópio para as aulas de biologia, ela criou através de uma impressora 3D. A ideia era de criar um equipamento para ser uma alternativa viável de baixo custo.
A estudante utilizou lentes retiradas de óculos 3D de realidade virtual, fios e botão liga/desliga. Ela nem sabia. Mas passou a ver a realidade em detalhes e as lentes já tornaram o mundo dela bem maior.
Luiz Claudio Ferreira – Repórter da Agência Brasil , .
Fonte: Agencia brasil EBC..
Sat, 15 Feb 2025 12:49:00 -0300