Não tem como negar que 2023 foi, certamente, um dos melhores períodos para o audiovisual brasileiro. Durante o ano, foram lançados filmes, documentários e séries que fizeram a cabeça do público e alavancaram tanto a audiência dos streamings quanto as bilheterias dos cinemas. Mais do que isso, mostrou a qualidade da nossa indústria.
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Um exemplo disso é que o documentário Retratos Fantasmas de Kleber Mendonça Filho chegou a ser cogitado para representar o Brasil na disputa pelo Oscar em 2024. Infelizmente ele ficou de fora, mas ainda assim se consolidou como um dos grandes lançamentos do ano e da Netflix. E por falar na gigante do streaming, séries como Todo Dia a Mesma Noite, que conta a tragédia da Boate Kiss, ajudaram a alavancar a audiência da plataforma.
Só entre janeiro e julho deste ano, a produção cravou nada menos que 50 milhões de horas assistidas, segundo números da própria plataforma. E, mesmo assim, ainda ficou atrás de outros títulos como Olhar Indiscreto, que conseguiu impressionantes 86 milhões de horas vistas.
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Outro grande sucesso foi DNA do Crime, uma obra em oito episódios que reconta um dos maiores roubos de fronteira que aconteceu no nosso país. Com Maeve Jinkings e Thomás Aquino no elenco, a produção se tornou um estouro do streaming e rapidamente foi renovada para a segunda temporada, contrariando o modus operandi da Netflix, que sempre espera um bom tempo para anunciar novos capítulos de suas produções.
E esse sucesso pode ser ilustrado em números. Só na sua semana de estreia, DNA do Crime conseguiu furar a bolha e ser uma das produções de língua não inglesa mais vistas da Netflix, acumulando 50,8 milhões de horas consumidas, de acordo com o próprio streaming.
Além do Brasil, ela fez sucesso em países como Argentina, República Dominicana, Equador, Venezuela, Paraguai, Peru, Uruguai, entre outros.
Globoplay também desponta com séries nacionais
Por falar na dupla Jinkings e Aquino, é bom lembrar que eles também protagonizaram outro sucesso de 2023: a série Os Outros, assinada por Lucas Paraizo (Sob Pressão) e que estreou no dia 31 de maio no streaming da Globo.
Com uma trama que mostra como um conflito em um condomínio pode se transformar em um verdadeiro caos, a série se desdobrou para um podcast e foi rapidamente renovada para uma nova temporada que vai estrear no segundo semestre de 2024.
Quem também não fez feio na Globoplay foi FIM, baseada no livro homônimo de Fernanda Torres, que chegou no dia 25 de outubro e chamou tanta atenção do público que fez com que o streaming enfrentasse problemas técnicos devido a sobrecarga de acessos.
Estrelada por Fábio Assunção, Marjorie Estiano, Débora Falabella, Bruno Mazzeo, Heloísa Jorge, Laila Garin e grande elenco, a série teve suas gravações interrompidas pela pandemia da Covid-19, mas felizmente conseguiu ser finalizada e abriu caminhos para que a autora começasse a desenvolver uma nova obra para o streaming — ainda sem título e data de estreia definidos.
Indo além, é fácil notar que não foram só as séries da Globo que fizeram sucesso no ano. A Globo Filmes encerra 2023 com 24 lançamentos nos cinemas, sendo 14 ficções e 10 documentários. Entre os principais títulos estão Nosso Sonho, Mussum, o Filmis e Nelson Pereira dos Santos – Uma Vida de Cinema, que foi exibido na sessão Cannes Classic e concorreu ao prêmio L’oiel D’or.
E, para o primeiro semestre de 2024, estão previstos 17 filmes: 13 de ficção, de gêneros diversos como drama, comédia e suspense, além de quatro documentários, entre eles os premiados na 25ª edição do Festival do Rio, Othelo, o Grande, de Lucas H. Rossi dos Santos, e Assexybilidade, de Daniel Gonçalves.
O preço do sucesso
Para conseguir resultados tão expressivos, o Globoplay teve que investir em produções originais. Teresa Penna, diretora do streaming e de Produtos Digitais Audiovisuais, comenta essa realidade. Segundo ela, a plataforma investiu R$ 1 bilhão em conteúdo, marketing e tecnologia e, é claro, nas obras originais. “Conteúdo brasileiro é a nossa maior fortaleza, uma premissa da Globo, que tem nos Estúdios Globo o maior complexo de produção audiovisual da América Latina”, diz.
Ela ainda comentou como esse investimento se refletiu em números para a empresa.
“Fechamos o ano com 36 produções originais de grande repercussão entre séries, documentários, programas de variedades, novelas, reality e humor. Sucessos como Todas as Flores, Os Outros, Rensga Hits, Xuxa – O Documentário, Fim e Vale o Escrito, por exemplo. Registramos em 2023 mais de 2,6 bilhões de horas de consumo. E 75% de tudo que é consumido é produção nossa. Histórias brasileiras criadas, dirigidas, produzidas e protagonizadas por brasileiros.”
Em 2024, o streaming planeja continuar investindo nesse tipo de conteúdo. Segundo ele, o streaming brasileiro deve lançar 20 Originais Globoplay no próximo ano, incluindo Justiça 2, a segunda temporada de Os Outros, os novos episódios de Rensga Hits e O Jogo que Mudou a História, produção que mostra o surgimento do crime organizado e da indústria do tráfico no Rio de Janeiro.
Prime Video dá um tiro certo em 2023
Outro streaming que também teve êxito com produções nacionais foi o Prime Video. Em agosto, a plataforma lançou Cangaço Novo, um faroeste moderno estrelado por Allan Souza Lima (A Menina Que Matou os Pais) e Alice Carvalho que conquistou não apenas o público brasileiro como também os espectadores de outros cantos do mundo. Pouco tempo após sua estreia, a obra entrou para o Top 10 dos mais assistidos em 49 países, ficando no topo da lista em muitos lugares, sobretudo na África. Até o momento, porém, a série não teve a sua segunda temporada confirmada.
Além dela, a segunda temporada de Dom também foi um chamariz. Com 87% de avaliações positivas da audiência no Rotten Tomatoes e nota 7,2 no IMDb, a produção mistura ação e drama para contar a história de Pedro Dom, um rapaz da classe média alta carioca, filho de policial, que se torna um dos principais bandidos do Rio de Janeiro. E o êxito é tamanho que a obra já tem até terceira temporada confirmada para o ano que vem.
Brasil brilha em outros streamings
Ainda falando em sucesso, é fácil perceber que não foram só a Netflix, Globoplay e Prime Video que despontaram no cenário nacional nesse ano. Outros streamings também resolveram dar uma chance às produções brasileiras e lançaram títulos interessantes em 2023.
O Paramount+ contou a história do lutador Anderson Silva na minissérie Anderson Spider Silva que estreou no dia 16 de novembro, o Star+ investiu no thriller Santo Maldito com Felipe Camargo, na segunda temporada de O Rei da TV, que conta a história de Silvio Santos e ainda no drama A História Delas, estrelado por Cris Vianna e Leo Jaime.
Quanto mais a gente tem, mais a gente quer
Com tantos títulos surgindo, é praticamente impossível falar de todas as séries e filmes brasileiros lançados em 2023, mas vale lembrar que além dos citados outros também conquistaram o público, como João Sem Deus: A Queda De Abadiânia, A vida pela frente, o filme O Sequestro do Voo 375 e a polêmica série Vale O Escrito que explica a guerra do Jogo do Bicho no Rio de Janeiro.
Para a produtora audiovisual, fundadora e sócia-diretora da Zencrane Filmes, Cláudia Natividade, o sucesso das produções nacionais neste ano está diretamente ligado à qualidade das obras lançadas. “Quantos mais produtos do audiovisual de qualidade a gente tem, mais público a gente tem”, diz.
Ela ainda comenta sobre a possibilidade de criar produções cujos cenários fujam do eixo Rio-São Paulo. “A gente tem percebido uma vontade dos próprios financiadores, das plataformas em buscar novos cenários, buscar atores diferentes. Isso tem possibilitado que a gente filme um pouco mais fora do eixo (Rio-SP).”
Teresa Penna, do Globoplay, também comentou o assunto.
“Temos como uma de nossas fortalezas e compromissos representar nas telas toda riqueza e multiplicidade cultural do país. Produzimos em todo território nacional, conteúdos de todos os tipos, gêneros e formatos. A exemplo da série Original Rensga Hits, que já tem a segunda e terceira temporadas garantidas, com gravações acontecendo também em Goiânia, no Centro-oeste brasileiro. Justiça 2, com gravações em Brasília; Guerreiros do Sol, próxima novela Original Globoplay, com gravações no Nordeste brasileiro; e Espécie Invasora, série Original Globoplay com gravações em Minas Gerais.
A verdade é que, segundo Cláudia, para que haja mais produções que fujam dos mesmos cenários, é preciso que os governos locais também incentivem o mercado do audiovisual, já que deslocar uma equipe para outros lugares é algo bastante caro.
O Brasil ainda é o país das novelas?
Com tantos filmes e séries fazendo sucesso, fica a dúvida se as novelas continuam conquistando o público brasileiro. De fato, 2023 não foi um ano bom para os folhetins da Globo, com Fuzuê amargando um dos piores resultados na faixa das 19 horas — com média de 20 pontos — e ficando na frente apenas do remake de Elas Por Elas, cuja melhor média chegou a 16 pontos. Terra e Paixão, por sua vez, até conseguiu resultados melhores, mas não atingiu nem 30 pontos, o que é preocupante para uma novela das 21 horas.
Indo na contramão disso, a romântica Amor Perfeito, estrelada por Mariana Ximenes, Thiago Lacerda, Camila Queiroz e Diogo Almeida foi uma das que teve melhor resultado, alcançando média de 20 pontos. Com uma trama leve e interessante, a novela tinha os ingredientes necessários para conquistar o público dessa faixa de horário, e talvez isso explique seu sucesso.
Outra que também foi bastante comentada é Todas As Flores, de João Emanuel Carneiro, que primeiro foi lançada no Globoplay e em 2023 chegou ao sinal aberto da Globo. Com um texto ácido e um elenco afiado, ela provou que o público não está necessariamente cansado de novelas, mas sim do que vinha sendo apresentado.
Onde criança não tem vez
Se 2023 foi um ótimo ano para o audiovisual focado em produções para adultos, para o público infantil a história foi diferente. Além do cinema decepcionar com pouquíssimos títulos para as crianças, os streamings também não investiram seus esforços nessa área. Prova disso é que títulos antigos como Carinha de Anjo e Carrossel continuam fazendo sucesso na Netflix.
A primeira cravou 54,4 milhões de horas assistidas no primeiro semestre de 2023, enquanto a segunda fechou com 71,3 milhões. Ambas ficaram atrás apenas de Chiquititas que conseguiu 162 milhões de horas assistidas.
Esses números podem ser um indicativo de que o setor infantil no audiovisual precisa se renovar nos próximos anos.
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Fonte: Canaltech