O Painel Governamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou a última parte do 6º relatório sobre o clima global, onde reúne os mais recentes achados científicos acerca do tema. Neste ano, o foco está em mostrar o aquecimento global e os perigos que a falta de medidas para impedi-lo pode trazer no futuro próximo.
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O documento não chega a ser alarmista a ponto de pensarmos que já estamos perdidos, porém também não é otimista dando esperança de que a solução será breve e fácil.
As constatações científicas do relatório foram revisadas por pares de mais de 195 países, garantindo a credibilidade dos dados. Embora tenha-se descoberto que as tecnologias de baixo carbono passaram por avanços e os países estejam assumindo compromissos nacionais mais ambiciosos, talvez isso não seja o suficiente para manter o aquecimento global em 1,5 ºC acima dos níveis pré-industriais, como apontava a meta definida no Acordo de Paris em 2015.
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Fugindo dos pontos de inflexão
Até agora, o planeta já sofreu um aquecimento de 1,1 ºC em relação a níveis pré-industriais, uma mudança que já mostra impactos ao gerar extremos climáticos por todo o mundo. Neste ritmo, de acordo com os cientistas, chegaremos a 1,5 ºC de aquecimento no início da década de 2030, o que significará extinções em oceanos e em solo, problemas nas colheitas e chances muito maiores de chegarmos aos pontos de inflexão.
Pontos irreversíveis (ou de inflexão) definem o desencadeamento de processos para os quais não teremos mais volta, como a morte dos corais e o derretimento de plataformas de gelo polar que aumentam o nível dos oceanos. Alguns estudos já apontam que, no Ártico, uma sequência de verões extremamente quentes já deixou o gelo em ponto crítico, aproximando-se perigosamente do ponto irreversível.
Os cálculos do IPCC apontam que os benefícios à sociedade e economia mundiais ao manter o aquecimento abaixo de 2 ºC superam quaisquer custos econômicos, como a mudança de matrizes energéticas e diminuição de emissões de carbono. Caso não façamos esforços para frear as mudanças climáticas, os anos quentes pelos quais passamos acabarão sendo os mais frios dentro do espaço de uma década. Atualmente, o planeta está mais quente do que em qualquer momento dos últimos 125.000 anos, e segue esquentando.
Embora seja mais provável atingirmos a marca de 1,5 ºC do que não, é preciso tentar impedir esse futuro trágico. Caso a meta seja essa, mas só consigamos chegar a 1,6 ºC, já estaremos muito melhores do que se não tentarmos nada, já que certamente o aquecimento global chegará a níveis ainda maiores.
Estimativas apontam que as emissões projetadas de CO2 das infraestruturas de combustível fóssil atuais já são o suficiente para ultrapassar as metas de emissão necessárias para atingir esse aquecimento, o que põe pressão sobre a indústria. Isso leva a um dos apontamentos do IPCC: é preciso que governos e iniciativas privadas mirem mais alto.
Metas mais rígidas
De acordo com o IPCC, mudanças na agricultura e em outros usos da terra para limitar emissões de carbono podem custar US$ 400 bilhões (cerca de R$ 2 trilhões), o que pode parecer muito, mas é menos do que os subsídios que esses setores recebem dos governos mundiais.
Os planos de ação governamental para a absorção de carbono da atmosfera (feita pela fotossíntese) e eliminação das emissões devem ser mais ambiciosos, especialmente tendo em vista que as soluções climáticas naturais ajudam a humanidade de diversas outras formas ao melhorar a qualidade do ar e da água, gerar renda, produzir mais alimentos e proteger a biodiversidade.
Da parte das empresas, é preciso mudar o foco para fontes de energia limpa e renovável — uma transição cujo custo tem diminuído —, ou procurar formas de compensar o impacto no caso de companhias com dificuldade nessa redução, como as da indústria aérea. Um exemplo é o “mercado de carbono”, onde o setor privado e outros emissores de carbono compram crédito pelas emissões que não conseguem evitar — esse dinheiro é destinado à proteção de áreas ameaçadas, ajudando na conservação e restauração de locais que não poderiam se regenerar sem o investimento.
Além dessas medidas, é preciso reconhecer a importância de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, inestimáveis protetores do carbono vivo. Taxas de desmatamento e locais manejados por tais comunidades são muito menores, com terras indígenas abrigando até 80% da biodiversidade restante no mundo, além de 17% do carbono florestal da Terra. Para isso, governos precisam reconhecer formalmente e garantir o direito à terra e uso de seus recursos por essas comunidades, sendo apoiadas pelo financiamento de ações climáticas.
Desafios para frear as mudanças climáticas
Muitos desafios ainda estão no caminho das metas climáticas. O secretário geral da ONU, Antonio Guterres, aponta que países com metas para emissão zero de carbono até 2050 deveriam aproximá-las para 2040, um esforço necessário para evitar catástrofes naturais.
Problemas globais, como a invasão russa da Ucrânia, atrasam bastante os esforços. As transformações em busca de energia solar e eólica já estão em curso, mas a guerra no leste europeu fez países da região voltarem a usar o altamente poluente carvão para garantir segurança energética, complicando as mudanças no setor.
Problemas como esse ocorrem em meio a negacionismos e interferências para tentar amenizar a urgência das metas energéticas mundiais. Os relatórios do IPCC são feitos por cientistas, mas o documento que resume seus achados é aprovado pelos governos de quase 200 países. As negociações acerca da versão final do texto incluíram tentativas de negociadores da Arábia Saudita de diluir a ênfase do papel de combustíveis fósseis no aquecimento global.
O lobby a favor da indústria petrolífera é apenas um em meio a tantos que serão afetados pelas transformações de matriz energética, mas cujo declínio pouco representa aos humanos frente as catástrofes que sua priorização poderá causar. Mesmo que o aquecimento se mantenha em apenas 1,8 ºC em relação níveis pré-industriais, o que é considerado até mesmo otimista por alguns cientistas, metade da humanidade poderá ainda estar exposta a níveis de calor e humanidade potencialmente fatais em até 2100.
Locais especialmente afetados incluem os trópicos, com países do oeste africano, sudeste asiático e partes do Brasil na linha de frente. Embora o relatório de 36 páginas nos traga informações e lembretes importantes, como as ferramentas que precisamos para as mudanças, é necessária vontade política — e um tipo de pressão que apenas uma população bem informada e comprometida a melhorar o mundo pode colocar nos governos.
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Fonte: Canaltech