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Demissão sem justa causa vai acabar no Brasil?

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Nas últimas semanas, redes sociais e grupos de WhatsApp foram bombardeados de informações incorretas sobre o julgamento de uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A informação de que a Corte poderia proibir a demissão sem justa causa no Brasil é imprecisa e o Canaltech trouxe algumas respostas para elucidar a questão.

Em resposta à BBC News Brasil, advogados explicam que o julgamento não se trata da proibição da dispensa sem justa causa, visto que derrubar essa regra seria inconstitucional. Entenda o que a convenção da OIT, que será julgada pelo STF, estabelece e como ela mudaria o atual modelo trabalhista.

O que diz a convenção 158 da OIT?

Lançada em 1982, a convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho estabelece a necessidade de justificativa para demissões iniciadas pelo empregador. Segundo o texto, essa justificativa pode ser de várias ordens conforme às necessidades da empresa. Confira alguns exemplos, a seguir:


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  • Ordem econômica: quando a empresa precisa cortar gastos e reduz o número de funcionários;
  • Ordem técnica: quando a função do empregado deixa de existir devido à automatização de processos;
  • Ordem de desempenho: quando a empresa julga que o desempenho do profissional está abaixo do padrão esperado.

A convenção não impede a empresa de demitir unilateralmente, desde que siga as regras estabelecidas pela legislação brasileira, mas passaria a exigir a justificativa do motivo do desligamento, mesmo que este não fundamente uma “justa causa”.

“O fato de o texto da convenção usar a expressão ‘justificar’ é que talvez tenha causado confusão [com a ‘justa causa’ da legislação trabalhista brasileira]”, comenta Fabíola Marques, sócia do escritório Abud Marques Sociedade de Advogadas e professora da PUC-SP.

Dentre os países que assinaram a convenção 158 da OIT estão: Austrália, França, Espanha, Finlândia e Suécia.

O que o STF vai julgar?

O Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1625, apresentada em 1997, que questiona a decisão do Presidente da épica, Fernando Henrique Cardoso, de retirar o Brasil do tratado internacional.

O acordo foi assinado em 1995, após uma votação do Congresso. No entanto, um ano depois, FHC revogou a participação do país.

Dessa forma, a discussão no STF é se o decreto, assinado há 25 anos, pelo até então presidente, é ou não constitucional. A justificativa é de que, se o Legislativo aprovou a assinatura, também deveria ter participado da decisão da saída do Brasil do acordo.

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Até o momento, oito ministros já votaram a consideração da ADI como procedente. (Imagem: Nelson Jr./SCO/STF)

O que mudaria na legislação atual?

Segundo a emenda constitucional, de dezembro de 2004, a convenção internacional não precisaria de uma Lei Complementar para ser aplicável. No entanto, por ser muito abrangente, o país fica responsável por adaptá-la à sua realidade — incluindo definir a partir de quando a decisão passaria a valer.

“Eles podem dizer que a medida vale, por exemplo, dos últimos 5 anos para cá, dos últimos dois anos para cá ou só daqui pra frente”, exemplifica Fabíola Marques.

Sobre o tema da convenção em si, entende-se que o Brasil já possui uma legislação que protege os profissionais de demissões arbitrárias sem justa causa, prevendo uma indenização compensatória.

Otávio Silva Pinto, sócio da área Trabalhista da SiqueiraCastro e professor da USP, explica que essa regra se fundamenta no artigo 7º da Constituição, no inciso I, que cita uma lei complementar que prevê a remuneração.

No entanto, essa lei complementar nunca foi redigida e votada pelo Congresso. Desde 1988, um dispositivo transitório define que, enquanto a lei complementar não fosse aprovada, o FGTS valeria como a indenização ao qual o artigo 7º se refere.

“Na prática, nós sempre tivemos uma regra dizendo que o trabalhador tem sua relação de trabalho protegida contra dispensa. A proteção depende de lei complementar, que deveria prever a indenização compensatória. Mas a Constituição tem 34 anos e a lei complementar nunca veio”, comenta o professor da USP.

Dessa forma, por falta de uma lei que detalhe como essa fundamentação deve ocorrer, o trabalhador fica dependente de como o profissional de justiça vai interpretar a situação. “O juiz pode ser chamado a resolver um caso concreto e decidir de maneira desfavorável à empresa — mas não necessariamente vai ser essa a conduta dos juízes”, afirma Silva Pinto.

Já na questão da possível proibição da demissão sem justa causa, Paulo Renato Fernandes da Silva, doutor em Direito, professor da FGV Direito Rio e advogado no Fernandes e Silva Advogados Associados, reforça que a convenção não poderia fazê-lo, justamente devido ao artigo 7º da Constituição.

“A regra já está definida na Constituição. Você pode criar alguns critérios que protejam um pouco mais o emprego, mas isso dependeria da redação de uma legislação específica”, diz Fernandes da Silva, que também é professor da Universidade de Coimbra.

Por que o assunto voltou à tona?

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Rosa Weber, atual presidente do STF, foi a responsável pela decisão que fez o assunto voltar à tona. (Imagem: Rosinei Coutinho /SCO/STF)

O tema voltou à tona devido a uma mudança no regimento interno do STF, em que foi estabelecido um prazo de 90 dias para a devolução de pedidos de vista feitos pelos ministros. A partir deste prazo, o processo fica liberado para que o julgamento seja retomado.

Essa mudança deve ser publicada ainda em janeiro, o que traria o julgamento sobre a convenção 158 da OIT para a pauta ainda no primeiro semestre de 2023. O processo estava paralisado desde outubro do ano passado.

O doutor em Direito, Fernandes da Silva, elogia a mudança no regimento do STF, que deve reduzir o tempo de julgamento de uma série de processos:

“Um ministro pede vista e não tem prazo para devolver o processo, é uma excrescência jurídica. Isso finalmente parece que acabou. Demorou muito para vir, mas finalmente veio. Tem que haver prazo para julgar os processos.”

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Fonte: Canaltech